Pular para o conteúdo principal

O fervor dos anos 80

No ano de 1983 eu comecei a trabalhar em um grande banco privado, situado no comércio de Salvador. Nessa época eu estava com dezenove anos de idade. Trabalhava seis horas, das treze horas às dezenove horas. Às vezes, saía muito apressado para chegar no Colégio Estadual Mário Augusto Teixeira de Freitas. Eu estava no 3º ano de Contabilidade, antigo 2º Grau. Ao largar o trabalho dezenove horas, eu subia no Elevador Lacerda para Cidade Alta, descia andando pela Rua Chile, passava pela Barroquinha e subia alguns degraus de uma escadaria que me levava a Rua do Paraíso e, por fim, chegando na Rua da Mangueira onde ficava o meu colégio. Essa caminhada era diária e tinha que fazer correndo para não chegar tão atrasado. Quando terminei o curso colegial de Contabilidade, continuei fazendo quase este mesmo percurso, descia a Chile e subia a Avenida Sete Setembro para estar no Curso Pré-Vestibular Sartre.

Trio Camelão/Chiclete - Foto: Jornal Correio da Bahia

Pela manhã, antes de começar a trabalhar, eu saía do Bairro Macaúbas, região do Barbalho, onde minha mãe morava e seguia para Academia Olímpia, em Nazaré, para fazer musculação e tomar uma sauna. Fazia academia quatro dias por semana. Sem falar que teria que ter o tempo precioso para estudar.

No final de semana eu não perdia a minha praia da Barra, bebia uma cervejinha e aproveitava para tirar uma foto naquela máquina Polaroid que revelava a foto na hora. Eu ficava emocionado quando o fotógrafo entregava a minha foto. Depois eu ia tomar um banho de mar, a água bem fria e gostosa. Saía andando pela água para sentar numa daquelas pedras do Farol da Barra. Eu usava a minha sunga branca ou amarela, passava o meu bronzeador, Helena Rubinstein ou Raiton de Sol, comprados nas Lojas Mesbla e Sandiz. Geralmente, permanecia quase o domingo inteiro na Praia do Farol. A pele ainda suportava sol, mas não deixava de usar um sombreiro para não me prejudicar.

Ao sair da praia, não resistia um chope no Oceania ou no Barra-Vento. Eram os melhores bares da época. Os bares de Salvador valorizavam a música ao vivo. A gente sempre contava com um som bacana de um cover, uma banda de música. Eu recordo bem dos bares Palhoça e do Travessia. O Travessia ficava numa esquina, próximo ao Clube Português, na Praia da Pituba. Lembro-me do repertório musical que era tocado: Caetano, Gil, Legião Urbana, Lobão, Maria Bethânia, Elba Ramalho, Paulo Deniz, Zé Ramalho, Raimundo Fagner e tantas outras interpretações que ouvíamos e que fizeram sucesso.

Nesta minha época do fervor musical dos anos 80, principalmente, no final de ano, o comportamento da cidade de Salvador mudava bastante. Eu já sentia a energia do verão. A musicalidade interferia ao meio e no clima. Se, os baianos deixarem serem levados pelo clima agradável e anestesiante que tem esta cidade, os mesmos podem se sentir muito relaxados e não fazerem mais nada. A festa toma conta. São as lavagens do beco, do bar, da rua, das igrejas, até se deparar com o carnaval. Como nesta época dos anos 80 os clubes estavam no auge, não faltavam shows. A Axé Music baiana e o rock brasileiro viviam o seu mundo de esplendor. A música fazia parte do nosso cardápio, porque ainda tínhamos uma boa safra de artistas. Tempo de fervor criativo, poesia, arte e futebol. Tempos que não voltam mais.


Por Conrado Matos
Psicanalista, poeta, escritor e filósofo

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Nosso Sarau recebe o escritor Goulart Gomes na edição de abril

A edição do Nosso Sarau de abril recebe Goulart Gomes, que realiza o lançamento de seu livro   Não foi tempo perdido , uma antologia pessoal comemorativa aos 40 anos de literatura do autor. O evento tem ainda bate papo com o escritor, feira de livros, recital de poesia, com participação de Alvorecer Santos, Ametista Nunes, Cacau Novaes, Dilu Machado, Emerson Bulcão, João Fernando Gouveia, Ramon Argolo, Rita Pinheiro e Rosana Paulo, além de um   pocket show   com Jorge Carrano e Chá Rize, entre outras atividades. O Nosso Sarau é um evento colaborativo, sem fins lucrativos, que tem a curadoria e produção de Cacau Novaes, coordenação artística de Alvorecer Santos e Marcos Peixe, com participação de diversos artistas e conta com o apoio cultural do Goethe-Institut Salvador. Toda a programação, que acontece presencialmente, também é transmitida ao vivo pelo Instagram  @nossosarau.ssa  na íntegra. Sobre o autor: Goulart Gomes é escritor, historiador e museólogo, criad...

Livros de Cacau Novaes concorrem a dois importantes prêmios literários do Brasil

Três livros do escritor José Carlos Assunção Novaes (Cacau Novaes) estão concorrendo a dois importantes prêmios literários do Brasil, o Oceanos e o Jabuti, ambos considerados de grande relevância para a literatura do país. Cacau Novaes - Foto: Divulgação Para o Prêmio Oceanos de Literatura, foram indicados os livros “Eu só queria ver o pôr do sol” e “Fonte de Beber Água”. Já ao Prêmio Jabuti, estão concorrendo “Português Afro-brasileiro: O preenchimento do sujeito pronominal na comunidade quilombola de Lagoinha”, “Eu só queria ver o pôr do sol” e “Fonte de Beber Água”. Sobre os livros : Português Afro-brasileiro : O preenchimento do sujeito pronominal na comunidade quilombola de Lagoinha – Este livro de José Carlos Assunção Novaes, decorrente de sua tese de doutoramento, apresenta um importante panorama sobre a questão a partir do estudo da comunidade quilombola da Lagoinha, localizada no estado da Bahia. Além de apresentar uma importante descrição sócio-histórica da comunidad...

Morrre, aos 80 anos, o escritor iguaiense Gramiro de Matos - 'Ramirão' - um dos representantes da literatura no Tropicalismo

Faleceu na manhã de hoje (7), aos 80 anos, o escritor iguaiense Ramiro Silva Matos Neto, que assinava seus livros como Gramiro de Matos ou ainda Ramirão ão ão. Um dos representantes na literatura do movimento tropicalista, ou Tropicália, juntamente com seus dois parceiros Waly Salomão e Torquato Neto. Gramiro de Matos - Foto: Mário Cravo Neto O velório e sepultamento acontecem amanhã (8), a partir das 9 horas, na Sala 06 no Cemitério Bosque da Paz, em Salvador. Gramiro de Matos, o tropicalismo e a poesia marginal Gramiro de Matos - Foto: Mário Cravo Neto (colorizada artificialmente) A poesia marginal teve um momento marcante com o lançamento da coletânea 26 poetas hoje (1975), organizada por Heloísa Buarque de Hollanda. Nessa coletânea, Heloísa faz um balanço de todo o período, publicando lado a lado a nova geração e alguns dos poetas que já estavam envolvidos com outros movimentos culturais, como o tropicalismo e a marginália. Waly Salomão, Torquato Neto, José Carlos Capinan e Duda Ma...

Cacau Novaes entrevista Nego Jhá: 'Vem pro cabaré'

Nêgo Jhá é uma banda do interior da Bahia, da cidade de Iguaí, situada no Centro Sul do estado, criada em janeiro de 2018, por Guilherme Santana e Gabriel Almeida, através de u ma simples brincadeira entre amigos, que resultou em um trabalho profissional.  A banda já contabiliza mais de 30 milhões de visualizações no YouTube com suas músicas, entre elas, destaca-se “Cabaré”, música de trabalho gravada por artistas famosos, que compartilharam vídeos, que viralizaram na internet, ouvindo e dançando o hit do momento em todo o Brasil. Até no BBB21 da Rede Globo já tocou a música dos garotos. Foto: Divulgação Confira abaixo a entrevista com os integrantes da Nego Jhá: Cacau Novaes - Como surgiu a ideia de criar Nego Jhá? Como tudo começou?  Nego Jhá -  Através de uma brincadeira entre mim, Guilherme, e meu amigo Gabriel, que toca teclado.  No início não tínhamos em mente de que isso se tornaria algo profissional, pensamos apenas em gravar por diversão e resenha. Ca...

Descobridor de talentos, Sérgio Mattos celebra os 20 anos de 40⁰ Models

Sérgio Mattos celebra os 20 anos de sua 40º Models e reflete sobre o legado construído nessas duas décadas Sérgio Mattos - Foto: Reprodução/Facebook   Gisele Bündchen  era ainda uma menina quando fez sua primeira viagem internacional como modelo. O destino era a ilha de Ibiza, o balneário e já epicentro da ferveção na Espanha. Ao lado dela, seu primeiro  booke r:  Sergio Mattos . Couber a ele descobrir e lançar  Isabeli Fontana ,  Rômulo Arantes Neto  e  Raica Oliveira , entre outros nomes reunidos por Serginho, como é conhecido, na  40º Models , agência criada por ele em 25 de outubro de 2004, há exatos 20 anos. Foto:  Vicente de Paulo – Parece que foi ontem e, por outro lado, quando a gente se dá conta, parece que já dura uma eternidade – reconhece o empresário por telefone, tendo como fundo musical a clássica gravação de “Something” na voz dos Beatles.  – Afinal, são gerações e gerações que despontaram aqui e que estão inseridas ...